Coisas que não vemos mas sabemos existir. Desejos e histórias que nascem e morrem num piscar de olhos. Palavras de um cérebro que sente e um coração que pensa. Eu nunca vi uma estrela cadente e mesmo assim procuro por ela todas as noites.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Sobre Lagartas com Asas

de Olivia Holsher

Tenho pensado sobre a velha história da lagarta querendo ser borboleta. Quanta espera, quanta paciência é necessária. Uma lagarta triste e cabisbaixa sonhando com aquelas asas coloridas e que passa a maior parte do seu tempo preocupada com tons e formas. O mundo esta cheio destas criaturas: pessoas desesperadas por beleza, almejando um ideal que nem sabem de onde vem.
Quem nunca fez ou ao menos pensou em fazer algum tipo de intervenção estética que atire a primeira pedra. Homens e mulheres, jovens e velhos, modernos e antiquados. A preocupação excessiva com a aparência começa a se tornar cultural, diria até banal. O corpo-objeto sendo cada vez mais objeto e menos gente. Perdemos assim a humanização do corpo, e tudo aquilo que chamamos defeitos. Aqueles sinais que nos fazem tão únicos começam a perder o sentido num mundo onde todos querem parecer iguais demais. Foi-se o tempo em que sardas, pintas e formas eram “charmosas”.
O ideal de beleza muda conforme os tempos. O que não muda é a historia da lagarta e da borboleta. A metamorfose. Só que no caso dos humanos, o preço pelo vôo pode ser caro demais. Cada vez mais vejo mulheres morrendo em mesas de cirurgia em nome de uma afirmação que nunca virá. A idealização do que possa ser perfeito ultrapassa o respeito pelo corpo, respeito pelo tempo. Rostos plastificados, silicones excessivos, banalização do vulgar.
Sinto falta de uma metamorfose interior, um aflorar de respeito e carinho. Falta de bons dias, sorrisos no elevador, conversas que ultrapassem a receita novela-tragédia-auto-ajuda. Alguém, por favor, abre aí uma clinica de embelezamento da alma!
Ser a favor da vaidade não é a mesma coisa que fazer dela um propósito de vida. As academias estão cheias de mulheres lindas, saradas e ignorantes. Os bares e as festas estão repletos de belos rostos e espíritos pobres. Um dia um amigo meu chegou a dizer que não importava que a menina não tivesse conteúdo, o importante era a “barriga tanquinho” que ela tinha. Não estou sugerindo que se fale de Dostoievski em plena danceteria. O fato aqui é: quem lê Dostoievski? Cadê as discussões literárias, a troca de experiências, a reflexão sobre os rumos que a humanidade toma?
A quantidade crescente de meninas desenvolvendo bulimia e anorexia também é gritante. Borboletas insatisfeitas, morrendo lentamente sob a pressão de serem aceitas. Coloridas por fora e monocromáticas por dentro.
Então decidi que se houvesse uma clínica de embelezamento da alma haveriam sessões de filosofia, aulas de gentileza, massagens culturais. E tudo indolor, ao preço simples de respirar e refletir, sem que seja o reflexo do espelho. E ainda assim passar o creme anti-rugas antes de dormir, sem medo de que a alma fique enferrujada.

PS: Esse é o texto que ganhou em 3o lugar no I Concurso de Crônicas da Academia de Letras e Artes de Ribeirão Preto no dia 11 de novembro, foi praticamente o Oscar pra mim!rs Certificado na parede e dinheirinho na poupança literária! =D

Um comentário:

  1. Uma parte da Patricia que eu nao conhecia.. Parabens mesmo.. Acho mtu bonito tudo que vc escreve! =D

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