Coisas que não vemos mas sabemos existir. Desejos e histórias que nascem e morrem num piscar de olhos. Palavras de um cérebro que sente e um coração que pensa. Eu nunca vi uma estrela cadente e mesmo assim procuro por ela todas as noites.

sábado, 15 de agosto de 2009

Parada Obrigatória - texto de Ailin Aleixo

Às vezes a distância é a melhor coisa que pode acontecer

Na guerra ou na vida, períodos de recuo são essenciais em qualquer boa estratégia. Ou simplesmente acontecem, atropelando nossa vontade-mesmo assim, continuam sendo estarrecedoramente úteis (depois de passada a raiva por termos sidos detidos na marcha, claro). Eles nos forçam a enxergar a situação sob outro prisma, com mais frieza e, por isso mesmo, de forma mais acertada e isenta dos erros de julgamento que a intensidade e a bile nos levam a cometer (o significado do ditado chinês "o lugar mais escuro é sempre debaixo da lâmpada" tornou-se, de repente, tão claro para mim como areia em dia de sol).

O grande barato de, vez por outra, nos distanciarmos do que é nos importa é sentir o que esse redimensionamento nos causa. E seja ele qual for, a retomada nunca é insípida: ou nos faz enxergar a placa de "rua sem saída" que teimávamos em não ver ou, feito polimento em prata, devolve o brilho ao que o tempo havia enegrecido. Talvez por isso alguns casais só se entendam depois de uma separação: a dor, a sensação de ficar sem centro gravitacional, não ter mais ali ao lado quem se ama, pode provocar verdadeiros milagres na dinâmica de uma vida em comum (e na vida solo). Mas não podemos contar com milagres, precisamos da razão. O problema é que nossa suposta sapiência tende a sub-avaliar o que se tem ou (talvez seja pior), exagerar na importância e, se quisermos ser felizes, é inútil proclamar independência emocional ou tornar-se escravo das paixões. Qualquer extremismo nos isola-e, curiosamente, é só dando um pequeno mergulho na solidão que compreendemos o valor do que nos rodeia e mora dentro de nós.
Tente um Monet

Depois de sofrer feito o cão por encarar tudo na base do oito ou oitenta, fiz um pacto comigo mesma: jamais levaria coisa alguma a ferro e fogo porque nada importa tanto. Absolutamente nada é imprescindível. Nem ninguém. Esse não é um discurso de auto-suficiência, pelo contrário, é uma reflexão de alguém que aprendeu na porrada (ou melhor, no choro) que só relativizando, tornando a existência e o coração mais leves, é que se pode ser feliz e, então, ser feliz com alguém. Pare de arrastar correntes, levar tudo tão a sério: a única coisa que você vai conseguir é uma úlcera. Cuide de quem ama mas não faça disso o objetivo da sua vida porque ficará, inevitavelmente, frustrado quando não tiver deles o que deu pra eles. Ou não tiver deles o que você ACHA que eles deveriam devolver. E será bem feito: você fez o que quis, porque quis, então não venha reclamar o troféu. Não existe prêmio para quem doa amor. Por isso, distanciar-se deveria ser uma tarefa cotidiana: evitaria que fôssemos sugados pelo redemoinho que sempre começa logo ali nos nossos pés, mas estamos ocupados demais pra ver. Evitaria que exercêssemos de forma tão eficaz, e perigosamente despercebida, nossos piores defeitos.

Quando algo começar a te enlouquecer, enfernizar ou surtar, use a técnica dos grandes admiradores de arte: recue diante da tela, mude de ângulo em relação a ela, observe as cores, os traços e os detalhes que, na correria, sempre passam despercebidos. Então notará que ela é muito mais do que aquele ponto preto que ficava, insistente, diante dos seus olhos.

Ser feliz, no final das contas, não é questão de sorte ou azar. É questão de perspectiva.

domingo, 9 de agosto de 2009

Aquele sobre merthiolates e espinhos

Não acredito em insensibilidade. Acredito em medo. Não acredito em maldade. Acredito em raiva não elaborada, em ódio. Acredito em mágoa, na mesma intensidade em que acredito em crescimento. Todos os sentimentos básicos, enraizados. Somos seres evoluídos perante a ciência, mas quando falamos em sentimentos, somos atrasados. Você sabe pedir prazos e preços mais baixos mas não sabe pedir perdão. Você é um excelente negociante mas é um péssimo ser humano. Dois lados, yin e yang. Você pode lutar contra a corrente se quiser. Pode deixar ser levado por ela, tanto faz. Acredite: no final, é você contra você mesmo. Sempre.
Calma lá, também acredito no amor. Na gentileza. Na coragem. E por incrível que pareça acredito, principalmente, na perseverança. Porque, diante todas as coisas que eu vejo, o complicado é continuar acreditando.
É dificil pedir ajuda. Significa, na sociedade, que falhamos e somos fracos, e claro que ninguém aqui quer ser fraco. Muitas vezes sou assim, ferindo para não ser atingida. Criando espinhos. E acabo sangrando sem ninguém para me dizer "quando casar sara", mesmo eu sabendo que não é bem assim. Você precisa de alguém que te diga que merthiolate não arde, alguém pra soprar quando arder. Você precisa, simples assim.
As vezes eu tenho preguiça de certas pessoas. Tenho preguiça até de mim mesma. Mas nada me dá mais cansaço do que insistir na infelicidade. Não tenho pena, nem dó. Tenho preguiça! Não sei em que ponto da vida esquecemos de pedir uma mãozinha amiga. É fácil confundir um "pedir colo" com desespero e carência. Não queridos, não sou um ser superior super-zen-fantástico que diz "preciso de você agora, me abraça" como quem pede um Big Mac. Muito longe disso. Só que eu afirmo: é um aprendizado possível. E eu vou continuar estudando, até passar no teste. As inscrições estão sempre abertas. Se eu continuar sendo reprovada, você me ajuda?

domingo, 2 de agosto de 2009

Cheers in the shower


Hoje eu cheguei à conclusão de que as melhores idéias sempre chegam na hora em que estou tomando banho. Idéias boas, ruins. Loucas, sensatas. Às vezes saio chorando do box. Outras vezes saio louca para escrever sobre aquilo. Essa noite por exemplo: liguei o chuveiro pensando em pessoas que se perderam de mim, pessoas que eu quis muito por perto. E enquanto eu verificava a temperatura da água( e dos meus sentimentos) pensei naquelas pessoas que já considerei rivais, inimigas, desafetos. Como preferirem. Esses seres existem nas nossas vidas, gostemos ou não. Foi regulando meu banho, durante a passagem do pelando-de-quente para o confortavelmente-quente que eu me dei conta do quanto essas pessoas foram e são importantes para o meu crescimento pessoal.Com elas eu aprendi a ser mais paciente; mais amorosa; mais corajosa; aprendi a me livrar de muitas amarras que me foram impostas socialmente durante o que eu chamo de vida. Das pessoas que me quiseram mal, tirei o melhor. Aquelas para quem eu desejei mal, me perseguiram noites a fio. Aquilo que odiamos em nós mesmos é sempre ainda mais odiável no outro. Enquanto fechava meus olhos, sentindo a água escorrer, senti que ia escorrendo também alguns dos meus preconceitos, minhas inseguranças. Acreditando que se não fosse aquela pessoa que eu tanto desejei nunca ter acontecido na minha vida, eu não estaria debaixo de um chuveiro pensando no tipo de cidadã que eu quero ser. No quanto eu já errei e acabei colocando a culpa num destino que nunca teve nada a ver com isso. Que tenhamos humildade e capacidade para reconhecer nossas falhas e nossas necessidades, e que aqueles que nos incomodam e que nos querem ver por trás tenham o gosto amargo do que mais temem: nosso próprio sucesso. Aos que desejaram, por um segundo que seja, a minha queda, um brinde. É devido à sua existencia que sou uma pessoa cada vez melhor, cada vez mais completa. Obrigado por isso. Tim-tim.
"Now that she's back in the atmosphere
With drops of Jupiter in her hair
She acts like summer and walks like rain
Reminds me that there's a time to change
Since the return of her stay on the moon
She listens like spring and she talks like June..hey hey.."

sábado, 1 de agosto de 2009

Julieta

Desde pequena sempre teve dor de cabeça por causa de seu nome. A mãe, romântica incurável, sempre foi apaixonada por Shakespeare. Foi assim que nasceu Julieta Maria Ramos Bongiollo com nome de heroína sofredora. Quis o destino que não fosse bem assim. Cresceu então, acreditando que deveria ser sempre uma boa menina. Sempre recatada, respeitosa e difícil quando se tratasse de homens. "Só assim um homem dá valor a uma mulher, minha filha", dizia Dona Dolores. Dolores, de dramalhões mexicanos. E mesmo suspeitando não se tratar de uma verdade universal, Julieta ia guardando os conselhos da mãe. Mas a sua verdade universal, temia, era outra.
No dia do aniversário de 18 anos roubou a velha garrafa do bourbon antigo do pai, sentou sozinha e, literalmente encheu a cara. Não, não era heroína. Nem sofredora. Julieta não sabia o que queria de um romance. Na verdade ela nem sabia se queria um romance. Julieta queria colocar-se à prova. Deitada na calçada suja, enquanto definia o que tinha naquele coração sem contornos, o vizinho ouvia Cazuza. "Seu amor é uma mentira que a minha vaidade quer". E ela queria.